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HISTÓRIAS COM NAVIOS | POR JOSÉ PAULO SARAIVA CABRAL

O grego e o holandês

[ Na vida profissional encontramos frequentemente a terminologia e as expressões da marinharia e convivemos com as leis da física e da engenharia naval. Algumas das histórias são engraçadas, mas o mais interessante é confrontarmos a realidade do dia a dia com os conhecimentos sobre navios que acumulamos na parte de trás das nossas cabeças.
As crónicas são apontamentos da vida de peritos navais, tão verdadeiras quanto o permite citá-las de memória, mas estão totalmente descaracterizadas no respeitante aos navios, comandantes, personagens, portos e nacionalidades. ]


Eram dois navios: o Grego e o Holandês e os comandantes tinham esses mesmos nomes, o comandante Grego e o comandante Holandês. Oriundos do mesmo porto, carregavam ambos um minério de chumbo (Lead Flotation), uma carga semelhante a barro, cinzenta, tão densa que para ter os navios na linha de carga máxima, esta ocupava apenas cerca de um terço da altura dos porões. Eram navios de porão único.

Pouco depois de iniciar viagem do norte de África para a europa, o Holandês emitiu uma mensagem de socorro reportando que o navio estava a adquirir um ângulo de inclinação permanente progressivamente maior. Medidas de prevenção tomadas: tripulação em alerta permanente, coletes de salvação vestidos, jangadas pneumáticas verificadas, foi decidido arribar de emergência ao porto mais próximo. O navio atracou em cais com um ângulo de adorno permanente de 26 graus! Perigosíssimo, como se pode imaginar!

Quase em simultâneo, o Grego emite pedido de socorro idêntico e, face ao progresso contínuo da inclinação, decide também arribar, o que fez num porto umas duzentas milhas mais a norte. Atracou com um ângulo de adorno permanente de 9 graus.

Convocadas as vistorias dos seguradores. Em ambos os casos, a carga estava claramente deslocada a um bordo, tinha um aspeto bem húmido e observavam-se algumas poças de água na sua superfície. Colheram-se amostras em vários pontos numas latas com uns 2 litros. Ao batê-las no chão, observava-se que a superfície da amostra se revelava cada vez mais húmida até adquirir um aspeto de papa. Estudaram-se num manual IMO as características da carga em questão e concluiu-se que esta só devia ser transportada desde que o nível de humidade estivesse abaixo de determinado valor.

Senhor comandante – perguntámos ao Holandês – por favor mostre-nos o certificado com os resultados das análises da carga, temos que ver se a humidade estava dentro do valor de segurança quando a embarcou. O Holandês produziu o certificado e, aparentemente, tudo estava dentro dos parâmetros.
Então, o que terá acontecido?

Concluímos que, embora a humidade das amostras do Holandês estivesse dentro de parâmetros aceitáveis, durante a viagem, com a pressão das camadas superiores de carga sobre as inferiores, as vibrações e os balanços do navio, a água entranhada terá subido por capilaridade e induzido níveis de humidade à superfície da carga muito acima do limite para ela correr. Assim, as faixas superiores da carga, cada vez mais húmidas, terão progressivamente corrido a um bordo, o bordo oposto ao da entrada do mar e, em resultado, o navio terá também progressivamente inclinado num processo contínuo: inclina os primeiros 5 graus, depois mais 5 e por aí adiante. Recorde-se que a carga era muito densa e uns poucos metros cúbicos pesavam muito…

Para o leitor que ainda não pensou: uma escada interior de um navio pode ter uma inclinação de uns 15 ou 20 graus em relação à vertical; se a escada estiver desenvolvida no sentido da largura e o navio estiver inclinado 25 graus, para subir ou descer essa escada a pessoa pode ter de vir pendurada no corrimão com os pés a dançar no vazio à procura de degraus ausentes. É aterrador!

Ao Grego, um velho lobo do mar de olho brilhante: – Senhor comandante, tem os certificados de humidade da carga ao embarque? Não tenho nada disso! Os peritos manifestaram a sua deceção e não esconderam a sua critica face ao que consideravam ser certa incúria por parte dele.
Então não tem os certificados de humidade? Ok, gentlemen! Não tenho certificados de humidade da carga, não senhor. Não tive tempo! Porque enquanto o Holandês passava os dias a correr de um laboratório para o outro à procura dos certificados, eu vi logo, no cais, que a carga estava muito húmida. Escolhi a mais seca para embarcar no meu navio e pronto! Cheguei até aqui, e só com 9 graus de inclinação; o Holandês quase que virou, ia dando banho à tripulação, pregou-lhes um grande susto, ficou 200 milhas mais a sul e atracou com 26 graus de inclinação, nem dava para dormir, até os sonhos ficaram inclinados!

Conclusão da história: o leitor que a tire…
A nós visitou-nos a ideia de que para além das regras e regulamentos, e há muitos, nunca podemos abandonar o bom senso e o raciocínio humano.

POR JOSÉ PAULO SARAIVA CABRAL (engenheiro naval)

 

José Paulo Ferreira Saraiva Cabral é formado em engenharia naval na University of Strathclyde em Glasgow, Escócia, em 1971. Serviço militar na Armada, passou pela Guiné-Bissau. Professor efetivo de Arquitetura Naval na Escola Náutica Infante Dom Henrique durante oito anos. Fundou e geriu a empresa de peritagem e consultoria Navaltik Portugal, com inúmeros projetos nacionais e internacionais.
Autor do livro “Arquitetura Naval - estabilidade, cálculos, avaria e bordo livre”, já fora de circulação. Autor dos livros “Organização e Gestão da Manutenção, dos conceitos à prática” e “Gestão da Manutenção de Equipamentos, Instalações e Edifícios”, publicados pela LIDEL, o primeiro em 6ª e o segundo em 4ª edição.

Lançou, em Março de 2023, o livro “O Navio e as instalações de bordo”.




 

















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